quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Embedida

O vulgar trepida e profana
Faz-se quente e sufocado
Dentre o mundo puritano,

Têm-se as mãos pro entre os lábios
Promíscuos e vãs
Olho-te aguçada e sagaz,
Ardente.
Esperando o suspiro preso, proibido.

É tão fugaz e insano,
Que perfídias fazem-se flores,
E cobras amores
Com surdinas e selvagens volúpias

Porém, tem-se a mordida
Escorre a gota peçonhenta
Que te faz perder os ares
Envaidecer
E não mais esquecer
Ficando nas entranhas
Mas passando ao amanhecer.
D'casmu.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Cântico negro

"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí!
Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide!
Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

José Régio

coisa boa é Deus quem dá, besteira é a gente que faz ♪ (Maria Rita)


meu tempo é quando... (Vinícius de Moraes)


O dia corre involuntariamente,
e percebe-se a irreversibilidade do tempo.
O que era há segundos deixou de ser.
Simplesmente não se pode voltar no tempo.
E isso é assustador,
ou em particular conclui-se que viver,
tem um sentimento paradoxal,
é aventureiro e ao mesmo tempo sensato.
Existe a ânsia de acertar
e a trágica possibilidade de errar,
e quando não se acerta, têm-se a ilusão de poder consertar,chamada esperença de tentar.
porém...

Tudo que acontece tem um motivo, por mais ínfimo que este seja.
angustiar-se em encontrar um grande amor, em um tempo turvo, "turvo tempo" ? Volta-se a trágica e melancólica narração, encontrei a pessoa certa, no tempo incerto, em que o tempo não existe. Tempo. Tempo.
Tempo ausente.
Que hipocrisia imunda.
Pergunte-se então: meu tempo será quando?